SOCIEDADE E MEIO
AMBIENTE
"A
consciência ecológica somente surgirá
quando aliarmos ao nosso conhecimento racional uma
intuição da natureza não linear
de nosso ambiente".
Frijoft
Capra
Dionei Delevatti
1. Introdução
Existe uma preocupação
premente com o meio ambiente, podemos dizer que esta assentou-se
nas últimas décadas, quando finalmente reconheceu-se
a finitude dos recursos ambientais e também o grau de destruição
que já havia acontecido nos mesmos, isto tudo derivado de
um único fator ou conseqüência as ações
do homem sobre o meio ambiente.
Podemos dizer, assim,
que o homem é o principal agente causador dos desequilíbrio
ambientais, isto decorre de um "modelo de crescimento" produtivista
e concentrador. Seguindo este raciocínio, sendo o homem o
principal agente que tem influência direta no meio ambiente,
é a estes que devemos concentrar nossas ações,
é a estes que devemos nos dirigir e a educação
ambiental é um meio de "reeducação", onde a
sociedade e a coletividade possam trabalhar uma nova relação
com o meio ambiente.
Esta relação
começa por uma nova postura, por um novo olhar, e é
isto, que a educação ambiental pode realizar, ou seja,
fazer com o homem possa ter uma relação mais harmoniosa
com o seu meio ambiente.
2. Uma leitura das
ciências e a natureza
Devemos inicialmente
averiguar como o homem concebeu o seu modo de conhecimento, o seu
modo de enxergar o mundo e consequentemente de agir nele, em especial
a civilização ocidental a qual pertencemos.
Rene Descartes é
considerado o fundador da filosofia moderna, o seu pensamento e
o modelo de investigação que concebeu são os
alicerces da ciência moderna. Seu método de investigação
é analítico. Consiste em decompor pensamentos em suas
partes e em dispô-las em sua ordem lógica. Em sua visão
deveria seguir o seguinte roteiro:
" o primeiro-
consistia em nunca aceitar, por verdadeira, cousa nenhuma
que não conhecesse como evidente; em segundo-
dividir cada uma das dificuldades que examinasse em
tantas parcelas quantas pudessem ser e fossem exigidas
para melhor compreendê-las; o terceiro- conduzir
por ordem os meus pensamentos, começando pelos
mais simples e mais fáceis de serem conhecidos,
para subir, pouco a pouco, como por degraus, até
o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo certa
ordem entre os que não precedem naturalmente
uns aos outros; e o último- fazer sempre enumerações
tão completas e revisões tão gerais,
que ficasse certo de nada omitir" (Descartes, 1960.
p 67 e 68).
O universo em sua concepção
era uma máquina, onde o comparou o corpo dos animais a um
relógio. Considerou o corpo humano uma máquina, comparando
que um onde homem doente é como um relógio mal fabricado
e um homem sadio a um relógio bem-feito (Capra, 1982).
A tentativa reducionista
de entender melhor o mundo resultou em um processo de fragmentação
do conhecimento fazendo deste o seu relacionamento com o meio que
o cerca. A base desta ciência, e que ainda perdura até
os dias atuais é resultado do cartesianismo que configuraram
os nossos pensamentos como podemos ver em sua afirmação
"... aplicá-los a todos os usos aos quais são próprios
e, assim, tornar-nos senhores e possuidores da natureza" (Descartes,
1960. p 136). A arte de dominar a natureza onde seus componentes
podem ser desmontados, particularizou o conhecimento e praticamente
eliminou as inter-relações e a interdisciplinariedade
das ciências. Talvez não fosse esta a intenção
de Descartes, no entanto, os seus seguidores e os alicerces da ciência
levaram a esta compreensão. Devemos perceber, no entanto,
que apenas os aspectos mais fáceis de serem compreendidos
dentro de uma grande obra são realmente aplicados, podemos
dizer que os "ismos" acabam comprometendo na maioria das vezes o
que grandes figuras da humanidade realizaram.
Apesar de alguns avanços
nas ciências, do conhecimento científico na superação
da fragmentação com uma abordagem mais sistêmica,
o sistema educacional continua caracterizando-se pela fragmentação
do conhecimento (Moraes, 1998).
Para Capra (1982),
a nova visão da realidade baseia-se na consciência
do estado de inter-relações e interdependência
essencial de todos os fenômenos físicos, biológicos,
psicológicos, sociais e culturais. Essa visão transcende
as atuais fronteiras disciplinares e conceituais e será explorada
no âmbito de novas instituições.
Construção
de redes interdisciplinares é um paradigma que precisa ser
trabalhado, ainda estamos acostumados as caixinhas, as gavetas onde
cada qual tenta depositar seu conhecimento e ter sua visão
de mundo. No entanto a complexidade e interdependência dos
efeitos ambientais nos sugerem que é praticamente impossível
de analisá-los sob um único prisma.
A seguinte passagem
pode ilustrar uma visão sistêmica e holística
do mundo:
Aí
estão eles, movimentando-se de um lado para outro
no meu citoplasma. (...) seu parentesco é muito
menos comigo do que entre si e com as bactérias
que vivem livremente lá fora à sombra
da colina. Sinto-os como se fossem seres estranhos,
mas acode-me o pensamento de que estas mesmas criaturas,
precisamente as mesmas, estão também nas
células das gaivotas e baleias, e na erva das
dunas, e nas algas marinhas, (...) e mais para o lado
da terra nas folhas da faia no quintal de minha casa,
e na família de jaguatirica (....) e até
naquela mosca pousada na vidraça da janela. Através
deles, estou ligado a todos os seres vivos; sim tenho
parentes próximos, parentes em segundo grau,
espalhados por todo mundo. (Thomas, Lewis apud
Capra,1982 p. 269).
3. O nosso "crescimento"
A concepção
de crescimento adotada pelo nosso modelo produtivista e concentrador
provocou desequilíbrios ambientais e sociais de proporções
desastrosas, estamos iniciando um novo milênio onde a própria
sobrevivência humana pode ser colocada em cheque.
Inicialmente devemos
contextualizar que houve uma certa confusão entre os termos
crescimento e desenvolvimento. Para Veiga, até o final da
Segunda Guerra Mundial e meados dos anos sessenta não se
fazia distinção entre desenvolvimento e crescimento
econômico. Discutia-se a melhor maneira de medir o crescimento
do produto anual de uma nação, mas havia um largo
consenso sobre a idéia de que uma economia cresce quando
a produção aumenta pelo menos no mesmo compasso que
a população. Segundo Sachs, um estreito economismo
levava a pensar que, uma vez assegurado o crescimento das forças
de produção, provocaria um processo completo de desenvolvimento
estendendo-se de maneira mais ou menos espontânea a todos
os domínios da atividade humana. Arrighi, sinaliza que o
conceito de industrialização também ficou atrelado
ao conceito de desenvolvimento, acontecendo, no entanto, que mesmo
quando o processo de industrialização migrou do núcleo
orgânico capitalista para os países periféricos
ou semi-periféricos, não representou desenvolvimento
para estes países.
Ainda para Veiga, não
existe ainda uma definição ou um consenso sobre desenvolvimento,
mas sim que este foi paulatinamente incorporando uma série
de aspectos: emprego, necessidades básicas, saúde,
educação, equidade, etc. Mais recentemente percebeu-se
que as necessidades ambientais de qualquer progresso futuro poderiam
estar comprometidas por um crescimento econômico predatório
de recursos naturais e altamente poluidor.
Também nas décadas
60/70 os movimentos ecologistas criticavam e questionavam os valores
da sociedade ocidental, propondo um novo ethos e coletivo como via
alternativa (Carvalho, 2000). Este movimentos conseguiram no decorrer
dos anos fazer com que o meio ambiente fosse paulatinamente incorporado
na concepção de modelos de desenvolvimento.
Apesar do meio ambiente
estar presente em diversas pautas de discussão, o seu avanço
em atividades práticas e eficazes ainda é pequeno.
O comprometimento das nações, ainda necessita avançar
para podermos afirmar que este esteja realmente inserido e principalmente
respeitado na proposição e execução
de políticas ambientais que atendam a necessidade vigente.
3.1 Os aspectos
sociais
Constam nos relatórios
do Banco Mundial, das Nações Unidas, da OCDE que:
cerca de 3,5 bilhões de habitantes do planeta, algo como
dois terços do total, olham para os sucessos da humanidade
do ponto de vista de uma renda per capita média de 350 dólares
por ano, algo como um dólar por dia. Também não
se consegue alguns centavos de dólar por criança para
resolver o problema da cegueira infantil que resulta da falta de
vitamina A, ou outros centavos que permitiriam comprar iodo e eliminar
o bócio. Cada um destes males atinge meio milhão de
crianças por ano (Dowbor, 1998).
O Brasil também
é considerado a oitava economia do mundo, no entanto, no
recente levantamento do PNUD (Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento), no Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH-2000) o Brasil obteve a 72? colocação,
ficando ao lado do Cazaquistão e Arábia Saudita. A
principal perda de pontos do Brasil se deu devido a dois fatores:
baixos índices educacionais e de expectativa de vida. Mesmos
nos países considerados ricos, como os Estados Unidos, que
é a maior economia mundial (Produto Nacional Bruto de oito
trilhões), um em cada cinco americanos é considerado
funcionalmente analfabeto e 14,4% da população vive
abaixo da linha da pobreza.
Segundo o estudo da
Fundação Getúlio Vargas (FGV, 2001), o Brasil
tem 49,6 milhões de pessoas vivendo na miséria, o
que representa 29,3% da população abaixo da linha
da indigência, com renda mensal inferior a R$ 80,00. Os pesquisadores
do FGV apontam um dado altamente preocupante, onde cerca de 46%
do total de pobres são crianças com menos de 16 anos.
O Mapa do Fim da Fome indica que seriam necessários R$ 21,689
bilhões por ano para acabar com a miséria no Brasil
(Correio do Povo, 10/07/2001, p. 17).
O Estado do Rio Grande
do Sul, apesar de ter o melhor IDH do Brasil, apresenta também
graves problemas com relação a miséria conforme
podemos constatar pela tabela baixo.
Custo para erradicar
a miséria no RS
Municípios*
|
População
2001
|
Proporção
Indigentes
|
Transferências
necessárias
por
ano (R$)
|
Total
do Estado
|
10.179.801
|
16,76%
|
675.629.320,45
|
Alvorada
|
183.421
|
17,26
|
11.396.166,84
|
Bagé
|
118.747
|
29,69%
|
14.230.260,49
|
Cachoeirinha
|
107.472
|
11,47%
|
4.215.653,68
|
Canoas
|
305.711
|
13,93%
|
17.799.717,26
|
Caxias do Sul
|
360.207
|
5,99%
|
11.646.500,89
|
Gravataí
|
232.447
|
11,93%
|
10.418.832,41
|
Novo Hamburgo
|
236.037
|
13,36%
|
11.592.626,80
|
Passo Fundo
|
168.440
|
8,31%
|
5.365.285,63
|
Pelotas
|
323.034
|
10,18%
|
10.711.290,59
|
Porto Alegre
|
1.359.932
|
10,56%
|
60.119.873,86
|
Rio Grande
|
186.755
|
15,77%
|
14.701.353,60
|
Santa Cruz do
Sul
|
107.501
|
10,30%
|
4.766.852,34
|
Santa Maria
|
243.392
|
15,98%
|
13.764.693,81
|
Sapucaia do Sul
|
122.677
|
12,96%
|
5.734.217,40
|
São Leopoldo
|
193.403
|
14,34%
|
10.568.158,81
|
Uruguaiana
|
126.561
|
20,91%
|
11.163.287,69
|
Viamão
|
226.669
|
18,68%
|
14.598.934,28
|
*
Com mais de 100 mil habitantes
Correio do Povo, 10/07/2001, p. 17)
A Bacia Hidrográfica
do Rio Pardo também apresenta contrastes nos aspectos sociais,
apesar do município de Santa Cruz do Sul apresentar um PIB
per capta de U$ 12.834,02, na região serrana da bacia acontece
de estarmos entre os PIB mais baixo do Estado do Rio Grande do Sul,
onde o município de Lagoão apresenta um PIB de per
capita U$ 818,33 (IBGE, 1999).
3.2 Aspectos ambientais
Os efeitos ao meio
ambiente são os mais diversos. Entre estes temos o efeito
estufa, onde a elevação da temperatura poderá
resultar em modificações profundas no regime de precipitações,
no ciclo natural das águas e na elevação dos
níveis dos oceanos. Para não piorarmos a situação,
seriam necessárias medidas de controle que inibem a emissão
de gases, ou pelo menos amenizem, principalmente a emissão
do dióxido de carbono CO2, que é o principal
responsável pelo aumento do efeito estufa (Boletim informativo
do Núcleo de Recursos Hídricos, no 4, 2001).
Em Bonn, 178 países
selaram o acordo sobre metas para cumprir o Protocolo de Kyoto (de
combate às mudanças climáticas e o corte de
emissões de gases causadores do efeito estufa). O acordo
básico inclui a aplicação dos créditos
de emissão de poluentes em troca da ajuda a conservação
de florestas e a produção de energia limpa, este acordo
foi realizada mesmo sem o apoio do EUA (Correio do Povo, 24 e 25/7/2001).
A nível global,
se protocolos como o Kyoto entre outras agendas internacionais de
preservação do meio ambiente, países ditos
"desenvolvidos" como os EUA e Canada se negarem a respeitá-los
as dificuldades serão imensas na preservação
do meio ambiente, uma vez que são eles mesmos os maiores
poluidores, somente os EUA é responsável por 22% da
emissão global de CO2 (Souza, 2000).
Também temos
o desequilíbrio climático, a escassez dos recursos
hídricos resultados de ações como desmatamento,
queimadas, destruição da flora e da fauna tendo como
conseqüência a perda da biodiversidade.
Esta situação
se reflete também na bacia hidrográfica do Rio Pardo
(BHRP), conforme LOBO e COSTA (1997):
"...
a crescente sobrecarga das águas superficiais,
especialmente nas imediações de grandes
zonas urbanas bem como de pólos industriais,
impõe a observância de critérios
ecológicos de avaliação superficialmente
capazes de detectar e representar a carga poluidora
e a tolerância, aos seus efeitos, nos ecossistemas
lóticos...".
A BHRP também
apresenta problemas que foram apontados pelos estudos realizados
pela ECOPLAN, destacamos a seguir alguns pontos críticos
citados:
- o escoamento hídrico superficial
em função das condições topográficas,
ocorre rapidamente no seu trecho superior e médio, acentuando
os efeitos das cheias e repercutindo em vazões mínimas,
durante as estiagens (esta situação reflete-se na
região serrana da bacia);
- os efluentes hídricos que
aportam aos cursos de água e aqüíferos, em
sua grande maioria urbanos, não recebem tratamento, quando
dispostos superficialmente. Já, na disposição
subterrânea, observa-se um grau de tratamento primário;
- a qualidade das águas está
fortemente influenciada pelos efluentes urbanos (esgotos domésticos)
lançados à rede hídrica sem tratamento;
- a exploração dos recursos
minerais (pedreiras próximas às nascentes, jazidas
de argila junto às planícies de inundação
de rios e arroios, extração de areia e cascalho
do leito e margens dos rios) tem originado alguns impactos importantes
sobre os recursos hídricos tais como a alteração
das condições qualitativas da água.
Também existem
a contaminação dos mananciais pelo mau uso do solo
(sem conservação) e a utilização de
adubos solúveis e agrotóxicos. A falta de conservação
de mata ciliares, e não destinação adequada
dos resíduos sólido contribuem para o agravamento
da situação.
3. O papel da educação
ambiental
É importante
conhecer o contexto onde estamos inseridos, a perceber de que maneira
o mundo é o que é, ou melhor, desvendar seus meandros,
racionalizar, refletir, intuir sobre a realidade que nos cerca.
Dentro desta perspectiva insere-se o papel da educação
ambiental.
A Conferência
Internacional sobre Educação Ambiental, a Conferência
de Tbilisi (1977) como ficou mais conhecida foi um marco histórico
de destaque na evolução ambiental, de onde houveram
as seguintes recomendações:
a) A educação
ambiental é o resultado de uma orientação e
articulação de diversas disciplinas e experiências
educativas que facilitam a percepção integrada do
meio ambiente, tornando possível uma ação mais
racional e capaz de responder às necessidades sociais;
b) Um objetivo fundamental
da educação ambiental é lograr que os indivíduos
e a coletividade compreendam a natureza complexa do meio ambiente
natural e do meio ambiente criado pelo homem, resultante da integração
de seus aspectos biológicos, físicos, sociais, econômicos
e culturais, e adquiram os conhecimentos, os valores, os comportamentos
e a habilidades práticas para participar responsável
e eficazmente da prevenção e solução
dos problemas ambientais, e da gestão da questão da
qualidade do meio ambiente;
c) O propósito
fundamental da educação ambiental é também
mostrar, com toda clareza, as interdependências econômicas,
políticas e ecológicas do mundo moderno, no qual as
decisões e comportamentos dos diversos países podem
ter conseqüências de alcance internacional. Neste sentido,
a educação ambiental deveria contribuir para o desenvolvimento
de um espírito de responsabilidade e de solidariedade entre
os países e as regiões, como fundamento de uma nova
ordem internacional que garanta a conservação e a
melhoria do meio ambiente;
- Para a realização
de tais funções, a educação ambiental
deveria suscitar uma vinculação mais estreita
entre os processos educativos e a realidade, estruturando suas
atividades em torno dos problemas concretos que se impõem
à comunidade; enfocar a análise de tais problemas,
através de uma perspectiva interdisciplinar e globalizadora,
que permita uma compreensão adequada dos problemas ambientais;
- O desenvolvimento eficaz da educação
ambiental exige o pleno aproveitamento de todos os meios públicos
e privados que a sociedade dispõe para a educação
da população: sistema de educação
formal, diferentes modalidades de educação extra-escolar
e os meios de comunicação de massa.
Para
Muller (sd), a educação ambiental num contexto de
sociedade pode permitir a compreensão das características
complexas do meio ambiente e interpretar a interdependência
entre os diversos elementos que conformam os seres vivos, com
vistas a utilizar racionalmente os recursos naturais na satisfação
material e espiritual da sociedade no presente e no futuro. Assim,
a mesma deve capacitar ao pleno exercício da cidadania,
através da formação de uma base conceitual
abrangente, técnica e culturalmente capaz de permitir a
superação dos obstáculos à utilização
sustentada do meio. O desafio da educação é
o de criar as bases para a compreensão da realidade.
Ainda na visão
de Muller (sd), a educação ambiental deve contribuir
para que haja comprometimento real das pessoas com os valores ambientais
e sintam interesse e preocupação com a natureza, motivados
de tal modo que possam participar ativamente nos projetos coletivos
locais e regionais de melhoria e de proteção da qualidade
ambiental, com reflexos imediatos na qualidade de vida das pessoas.
Deve também tornar consciente de que o verdadeiro objetivo
do desenvolvimento é melhorar a qualidade de vida das pessoas.
É um processo que torna possível aos seres humanos
perceberem seu potencial, obter autoconfiança e uma vida
plena, com dignidade e satisfação.
Temos que o papel da
educação ambiental é amplo, onde procura-se
uma articulação de diversas disciplinas, este talvez
seja o primeiro desafio a ser superado, fazer com que o conhecimento
se processe pela interdisciplinariedade.
O processo de aproximação
do indivíduo/coletividade com o seu ambiente é de
fundamental importância, pois como valorizar o que não
conhecemos, de ver o que se tem de bom ou de ruim no ambiente que
nos cerca, onde todos somos responsáveis.
Também devemos
ressaltar o reconhecimento do ambiente que nos cerca. Normalmente
estamos acostumados com a paisagem, seja esta natural ou até
mesmo de aspecto degradante, a rotina continuada faz com que o "costume"
se torne parte do meio fazendo com isso que aspectos relevante de
nosso meio ambiente sejam aos poucos esquecidos, sejam eles ambientais,
culturais, etc. Até mesmo a violência, principalmente
nas grandes cidades sejam encarada com "naturalidade" pelos seus
habitantes.
A seguir apresentaremos
um esquema sintético da educação ambiental,
procurando visualizar todas os fatores que ela procura contemplar
ou estão inseridos dentro do seu contexto.
Quadro: A educação ambiental em
rede
O processo de educação
ambiental compreende a interdependência entre os fatores econômicos,
ambientais e sociais, o conhecimento da realidade local, a consciência
cidadã entre outros fatores como podemos observar no quadro.
Assim apresentaremos
a Matriz do Itinerário de Desenvolvimento- ID, que faz parte
de um Diagnóstico Rural Participativo (DRP), realizado durante
o ano de 2000, na Região do Vale do Rio Pardo. A apresentação
desta matriz tem como objetivo verificarmos na nossa realidade,
através de um processo histórico, a interdependência
e conseqüência nas alterações dos fatores,
procurando visualizar como um influencia e transforma o outro. Consideraremos
os fatores econômicos, ambientais e sociais para esta análise.
O DRP é um processo de aprendizagem intensivo, sistêmico
e semi-estruturado, realizado em uma comunidade rural por uma equipe
multidiciplinar, a qual inclui pessoas das comunidades. Pode ser
utilizado para a identificação de necessidades, estudos
de viabilidade, identificação de prioridades, monitoria,
acompanhamento e avaliação de projetos.
O diagnóstico
inclui o uso de diversas ferramentas e instrumentos para sua implementação
como o uso de mapas da comunidade (infra-estrutura, solos, etc),
caminhada transversal, entrevistas semi-estruturadas, enfim existe
uma gama de instrumentos que podem ser utilizados na realização
do DPR. Destes instrumentos vamos destacar o Itinerário de
Desenvolvimento (ID) que é uma análise dos fomentos,
mecanismos e conseqüências das transformações
técnicas, econômicas, sociais e ambientais da comunidade
com base na identificação das etapas, desde a origem
da comunidade até os dias atuais com a visualização
do processo de diferenciação social. São entrevistados
pessoas que acompanharam o desenvolvimento da comunidade, ou seja,
pessoas que são mais antigas na comunidade. Na caminhada
transversal é interessante notar a forma diferenciada do
agricultor que habituado ao seu meio ambiente, possa a partir desta
visualizar com "novos olhos a sua própria realidade", detectando
através da caminhada processos erosivos, matas, depósitos
irregulares de lixo, etc.
Apresentaremos a seguir
a tabulação da matriz do itinerário de desenvolvimento
da comunidade de Vila Melo, município de Vale Verde. O itinerário
apresenta aspectos econômicos, socio-culturais, ambientais
e fatos relevantes ocorridos na comunidade. Este processo é
análogo a outras comunidades da região do Vale do
Rio Pardo.
MATRIZ DE TABULAÇÃO
DO ITINERÁRIO DE DESENVOLVIMENTO- ID
Período-Origem
|
Econômico
|
Sócio-cultural
|
Ambiental
|
Fatos
Relevantes/crises
|
1880 a 1940: origem
da comunidade; primeiros moradores
|
- Culturas milho,
feijão, arroz, aipim, centeio e trigo para panificação
para subsistência.
- Charque e toucinho
suíno para venda ou troca por querosene, sal e sementes.
- Produção
de uva e vinho(1925)
- Produção
de pedras
- Alambiques-
primeiro em 1880, e o segundo 1910.
- Produção
de açúcar mascavo fumo de corda e de galpão
(1910). Fumo de estufa (1920-1930) Souza Cruz
- Produção de
sementes próprias
|
- Sistema de transporte
era carroças, cavalos
- Alimentação
com base na subsistência, produzida nas propriedades
(aipim feijão arroz, milho, charque, banha, carne cozida)
- Casas de madeira
e pedras. Cozinha separada da sala dormitórios e salão.,
pontes de pedras
- Famílias
numerosas - 15 filhos
- Origem Alemã
e portuguesa. - Religião predominante evangélica,
mas tinha também católicos.
- Forte sistema
de integração (mutirões)
- Lazer jogos
de argolinha, bandas, muita festa.
- Educação:
aulas em alemão na casa da professora (Berta Spies,
1925), na capela (1930)
- Medicina caseira,
plantas , Benzedeiras, parteira, curandeira.
- Construção
da capela (1927).
|
- Mata virgem
- Divisão
das terras por cercas de pedra e valetas
- Derrubada de
mata para plantio, construções e consumo (lenha)
- Caça
e pesca,
- Água
natural (fontes e cacimbas rasas )
- Bugio, paca,
lebre tatu, cotia, mão pelada, pássaros, guará
- Flora e fauna
abundantes
Inicio das pedreiras
|
- Divisão
da comunidade (construção da capela)
- Durante o ano de 1936 os
agricultores não conseguiram comercializar seus produtos
( crises de preços), estocaram os produtos por um ano.
|
1940 a 1960
|
- Inicio do plantio
de fumo de estufa
- Incremento da
agricultura aumentou a venda de produtos
- Aumentou o uso
de subprodutos (farinhas)
- Cooperativa em Venâncio
Aires (1940-1945)
|
Escola comunitária
(1945) primeiras rodovias- transporte, Fortificou a religião
católica presença de auxílio mútuo
( que diminuiu).
Cemitério ( 1955)
|
Aumento do desmatamento
Inicio do uso de agrotóxicos
no final do período
|
Proibição
de falar a língua alemã (Segunda Guerra Mundial
) e suspensão das aulas
Forte seca em 1945
|
1960 a 1985
|
- Intensificação
da fumicultura e extração de pedras
- Aumento de utilização
de insumos agrícolas, - - - Diminuição
das culturas do milho, feijão...em favor da cultura
do fumo
|
- Chegada da energia
elétrica (1960)
- As casas começaram
a ser construídas com tijolos, brasilit, com mudança
de estilo de construção.
- Aumento de parceria
nas pedreiras, aumento do poder aquisitivo
- Inicio do êxodo rural,
divisão das propriedades, - - - - Filiação
sindical em diversos municípios
|
- Intensificação
do desmatamento,
- Destruição
das rochas
- Diminuição
da fertilidade dos solos
- Aumento do uso
de agrotóxicos
- Diminuição
da fauna
|
- Corte de energia
em 1969, retorna em 1974.
- Construção
do pavilhão dividiu comunidade (1979-1980)
- Inauguração
do pavilhão(30/1082)
- Organização
da Sociedade católica
|
|
- Monocultura
do fumo, - - Busca de novas alternativas (hoje): Leite, amendoim,
peixe, mel, pepino, queijo.
- Aumento do custo
de produção das lavouras
|
- Aumentou o consumo
de produtos de fora da propriedade
- Aumento do consumo
de produtos industrializados, Intensificação
da divisão das propriedades.
- Construção
da nova escola municipal,
- Meios de comunicação
(3 telefones)
- Intensificação
do êxodo rural (jovens) 1985.
- Algumas famílias
possuem água em abundância, outras sentem falta
em certas épocas.
- Surgimento do
clube de mães
- Mudanças no habito
alimentar (carnes)
|
- Aumento do reflorestamento
com eucalipto
- Abandono de
áreas agrícolas Aumento de cargas
- Ressurgimento
da fauna, diminuição da caça (proibição)
|
- Organização
forte Clube de Mães
- Asfalto da RS
405(1994)
- Diminuição
de mão de obra
- Pessimismo com
relação à fumicultura
- Emancipação
do Município
- - Regulamentação
na exploração das pedreiras
|
Fonte: Curso de Desenvolvimento
Rural Sustentável e Metodologias Participativas, II Módulo,
2000.
Podemos perceber através
da matriz as inter-relações entre os fatores econômicos,
socioculturais e ambientais. Para uma melhor síntese, dividiremos
em três grandes períodos onde podemos analisar a evolução
ocorrida na comunidade:
1880-1940 O
sistema econômico predominante de subsistência onde
se produzia o máximo na propriedade e com isso menor dependência
externa. Sistema social com a ocorrência de mutirões
pela população envolvendo a auto-ajuda em termos de
plantio, saúde, etc. Em relação ao meio ambiente
ocorria a degradação em termos de caça e desmatamento.
1940-1980 Durante
este período ocorre início e consolidação
da revolução verde com o incremento da monocultura
de fumo e a utilização cada vez maior de adubos solúveis
e agrotóxicos. O sistema social perde força, diminuindo
a auto ajuda e começando aumentar paulatinamente o individualismo
(são instaurados processos competitivos e não cooperativos).
O meio ambiente é atingido por meio da presença de
agroquímicos das lavouras de fumo, diminuição
da fertilidade do solo entre outras conseqüências.
1980-2001 Consolida-se
o processo econômico, o individualismo é a conduta
social, o meio ambiente continua sofrendo agressões, apesar
de medidas restritivas como a proibição da caça
e do corte de mato, abandono de áreas agrícolas e
surgimento de capoeirões (êxodo rural) e começa
o surgimento da consciência ecológica. Consta-se que
este período é a consolidação dos processos
econômicos, sociais e ambientais surgidos no período
anterior.
Existe uma inter-relação
entre os fatores econômicos, sociais e ambientais como podemos
acompanhar na matriz de desenvolvimento da comunidade. As principais
alterações são no modelo econômico-produtivo,
da subsistência e venda do excedente para um sistema altamente
dependente de insumos externos, uma mudança no sistema social
de um trabalho de auto-ajuda e mutirões para um modelo individualista
e ambientalmente do desmatamento e caça, posteriormente a
utilização de agroquímicos (agrotóxicos
e adubos solúveis) e atualmente leis restritivas quanto ao
corte do mato e a caça.
O que vemos foi uma
evolução de 120 anos, onde uma das principais conseqüências
do modelo competitivo foi a perda ou quebra dos laços sociais
da comunidade, em outras palavras da diminuição do
capital social da região. Também houveram conseqüências
ambientais principalmente em termos de diminuição
da fauna e da flora.
Temos que análise
nos leva a considerar a interdependência entre os fatores
analisados, uma mudança no sistema tecnológico, como
por exemplo o que foi realizada pela revolução verde,
tem conseqüências no sistema econômico, no social
e no ambiental. Vemos desta forma a importância e o inter-relacionamento
entre os mesmo, não podemos conceber que uma ciência
isoladamente possa trazer saber e desenvolvimento estando alheia
as demais ciências e mesmo ao saber da população
a qual pretende beneficiar.
Considerações
Finais
Inicialmente temos
que a ciência desenvolveu um sistema de conhecimento fragmentado
e disciplinar, onde este é analisado por partes não
possibilitando a visão do todo. Para a educação
ambiental é necessária uma visão interdisciplinar,
holística da realidade, esta talvez seja o primeiro grande
desafio para o estabelecimento de uma nova postura do ser humano
com relação ao seu meio ambiente e principal para
a formulação do conhecimento. O grande entrave para
isto acontecer é o modelo vigente, onde apesar de alguns
esforços para que aconteça o exercício da interdisciplinariedade,
os avanço ainda são pequenos, onde o processo educativo
ainda, na maioria dos casos, possui um caráter estritamente
disciplinar e técnico.
O modelo concentrador
e produtivista é outro determinante para o desequilíbrio
ambiental e social. Este fato se reflete na poluição,
na destruição de florestas, da camada de ozônio,
da biodiversidade (estamos perdendo riquezas inestimáveis
sem ao menos nos darmos conta de que a temos). Juntamente com a
destruição do meio ambiente temos o desequilíbrio
social.
Neste sentido é
necessária uma mudança, um questionamento de como
podemos alcançar o desenvolvimento, devemos lembrar também
que o mesmo é projeção de toda a sociedade,
que não existem fórmulas prontas, que não vem
por decreto e que nem cairá do céu, mas sim é
resultado de um esforço coletivo de uma sociedade e que para
isso é necessário que a mesma esteja organizada (Delevati,
2001).
A educação
ambiental tem como intuito uma mudança da relação
homem-natureza, é uma mudança comportamental, de visão
de mundo e de troca de paradigmas.
A educação
ambiental ultrapassa em muito as esferas hoje desencadeadas como
processos educativos. Ela trabalha com dimensões como a ética,
a cidadania, a participação, com a interdisciplinariedade,
com o conhecimento da realidade local, desta forma a sua abrangência
tende a uma modificação na maneira de se conceber
e fazer um processo educativo.
A participação,
é uma das mudanças necessárias, mas temos que
ter uma atitude participativa (por exemplo que resposta eu daria
a pergunta - eu sou participativo?). Temos que estar ferramentados
(metodologicamente) para que o processo possa se desencadear de
uma maneira correta. São inúmeros os processos ditos
participativos que na realidade muito pouco tem de participativo.
Para Moura (2001),
a educação ambiental está associada com a tradição
da educação popular que compreende o processo educativo
como um ato político no sentido amplo, isto é, como
prática social de formação de cidadania. A
educação ambiental popular compartilha com essa visão
a idéia de que a vocação da educação
é a formação de sujeitos políticos,
capazes de agir criticamente na sociedade. O destinatário
desta educação são os sujeitos históricos,
inseridos numa conjuntura sociopolítica determinada.
Temos assim que a educação
ambiental é um pressuposta básica para um novo relacionamento
entre o Homem e a Natureza. È através dela que se
podemos tentar modificar o atual estágio de desequilíbrio
social, econômico e ambiental o qual vivemos em nosso tempo.
Tarefa esta que é um dever de todos - das instituições,
do poder político, dos cidadãos - enfim de todos os
atores sociais que estão comprometidos com um modelo de desenvolvimento
sustentável, não apenas na concepção,
mas também em ações, pensamentos, posturas,
sentimentos e sensações.
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